imagem: Jia Lu, Illuminated

"EM CADA CORAÇÃO HÁ UMA JANELA PARA OUTROS CORAÇÕES.ELES NÃO ESTÃO SEPARADOS,COMO DOIS CORPOS;MAS,ASSIM COMO DUAS LÂMPADAS QUE NÃO ESTÃO JUNTAS,SUA LUZ SE UNE NUM SÓ FEIXE."

(Jalaluddin Rumi)

A MULHER DESPERTADA PARA SUA DEUSA INTERIOR,CAMINHA SERENAMENTE ENTRE A DOR E AS VERDADES DA ALMA,CONSCIENTE DA META ESTABELECIDA E DA PLENITUDE A SER ALCANÇADA.

BLOG COM MEUS POEMAS:

http://desombrasedeluzanna-paim.blogspot.com/



terça-feira, 5 de maio de 2009

CONSUMO ÉTICO E AÇÃO POLÍTICA

.



(...)Consumo ético, na proposição dos autores e organizadores do livro The Ethical Consumer (Harrison; Newholm; Shaw; 2005), se refere a um ato de compra (ou não compra) no qual estão implícitas as preocupações do processo de consumir com os impactos que isso possa causar ao ambiente econômico, social ou cultural. Ou seja, ele está circunscrito ao fato de que o consumidor pensa e se preocupa com os efeitos que uma escolha de compra gera aos outros e ao mundo externo como, por exemplo, com o tratamento despendido aos trabalhadores envolvidos na produção de um determinado produto, ou com os impactos ambientais que certos produtos causam.

Esse tipo de atitude, que pode ser individual, só se tornaria política ao se condensar em um coletivo, denominado de movimento de consumidores ou consumer activism, nas proposições de Lange e Gabriel (2005). Empreendendo uma breve história sobre o ativismo dos consumidores, os autores demonstram como esse termo não é novo, remontando ao século XIX, através de histórias de boicotes e de formação de cooperativas de compras, como as cooperativas inglesas emergentes no final do século XIX, formadas em reação aos preços excessivos e à má qualidade dos produtos. Os autores reconhecem que o ativismo dos consumidores tem sido pouco teorizado na literatura histórica e acadêmica, mas apontam para a importância que o movimento pelo consumo ético tem ganhado nesse início de século, na medida em que as questões contemporâneas que o movimento tem levantado envolvem problemas complexos como a sustentabilidade do planeta, o comércio justo, a solidariedade social, e os direitos do consumidor enquanto direitos de cidadania.

Mas qual é o alcance e a efetividade desse tipo de movimento? Murphy e Bendell (2001) descrevem os consumidores como a nova força capaz de enfrentar as grandes corporações em face do declínio do poder e a da influência dos sindicatos trabalhistas; e que eles, de fato, estão causando impactos profundos nos projetos das grandes corporações. Segundo os sociólogos Beck (1999) e Giddens (1990), tendo em vista que muitos dos riscos que nós estamos enfrentando são decorrentes das nossas próprias ações humanas na construção das sociedades de consumo, tais ações passaram a ser questionadas e politizadas. Sob essa perspectiva, o “consumo ético” estaria provocando uma mudança na atual sociedade de consumo de massas e formatando uma nova “cultura de consumo”.

Mas até que ponto esse tipo de atitude pode ser considerada política no seu sentido amplo, qual seja, na determinação de uma transformação social que altere o jogo de forças no qual predomina, hoje, o mercado? Na literatura crítica internacional, há dois tipos de interpretação: a que acredita na importância do movimento em provocar mudanças radicais na sociedade contemporânea e, nesse sentido, promover a transformação social; e, em uma perspectiva oposta, uma interpretação que recusa ver o movimento como uma forma de ação política.

(...)Buscando entender o que provocou o florescimento de movimentos pelo consumo ético nas últimas três décadas, Harrison et al. (2005) identificaram sete fatores: a globalização dos mercados e o enfraquecimento dos governos nacionais; a ascensão das marcas e corporações transnacionais; a ascensão de campanhas de grupos de pressão; os efeitos dos avanços tecnológicos sobre os ambientes natural e social; o deslocamento do poder do mercado em direção aos consumidores; a eficácia de campanhas de mercado; o crescimento de um amplo movimento de responsabilidade corporativa. Tais fatores teriam emergido como resultado de uma sociedade de consumo no qual o mercado tornou-se dominante, mas cujas conseqüências sociais teriam transformado o consumo em um espaço de disputa política, tanto pelos problemas a ele associados, quanto pela “descoberta” da força do consumidor frente ao poder do mercado.

(...)O processo funcionaria da seguinte maneira: diante da pressão de movimentos de consumidores, especialmente do “patrulhamento das ONG´s”, as empresas estariam sendo impelidas a desenvolverem um modelo de produção socialmente responsável como uma nova estratégia de negócio.

(...)De fato, esse modelo cultural que ainda predomina nos nossos dias é que o movimento de consumidores pelo “consumo ético” vem questionar. Nesse sentido, é interessante apontar como, em seus primórdios, as batalhas travadas em torno do consumo ético não colocavam em xeque a sociedade de consumo de massas. Pelo contrário. Eram batalhas pela inserção no modelo, visando baixar os preços dos produtos ou questionando a higiene, a qualidade ou a segurança dos mesmos. Foi apenas a partir da década de 1970 que começou a emergir, muito lentamente, uma nova forma de organização de consumidores voltada a questionar o consumo excessivo e propor alternativas a ele. Segundo Harrison et al. (2005) essa nova onda de ativismo passou a envolver temas como consumo verde, ética, solidariedade para com o terceiro mundo e orientações para comércio justo. Entretanto, para esses autores, somente a partir da década de 1990 é que foi possível apreender uma coerência global desses movimentos que pudesse agregá-los em torno do termo “consumo ético”, especialmente a partir da criação da Ethical Consumer Research Association (ECRA), no Reino Unido, e do Council on Economic Priorites, nos Estados Unidos. Assumindo o poder do consumidor – “cada vez que você se dirige a uma caixa registradora, você vota.” (Will; Marlin; Corson; Schorsch; 1989:143) – esses novos movimentos passaram a afirmar que seus objetivos seriam provocar uma mudança cultural e promover a consciência do consumidor sobre as implicações globais do padrão de consumo do mundo ocidental.

(...)a publicidade da moda admite que realmente há algo de errado com a nossa existência, que o mercado não nos deu tudo o que prometeu, que não resolveu os problemas decorrentes do desenvolvimento capitalista...Seguindo essa grande narrativa publicitária, estimulada todos os anos por centenas de bilhões de dólares, o problema maior de nossas sociedades seria o conformismo, e a resposta apropriada, o carnaval... Para resistir, seria preciso que freqüentássemos as redes de restaurantes ‘étnicos’, ou víssemos os vídeos de Madonna. Ou simplesmente homenageássemos os consumidores que o fizessem... A crítica do capitalismo tornou-se, de forma bem estranha, o sangue salvador do capitalismo. É um sistema ideológico fechado, dentro do qual a crítica pode ser abordada e resolvida, porém de maneira simbólica. (Frank, 2004).

De fato, quando nos deparamos com o imenso “mercado verde” ou com o “mercado da cidadania”, relacionados, respectivamente, a atitudes politicamente corretas e a ações de filantropia e de responsabilidade social, somos tentados a concordar com Frank e a admitir que esses movimentos de consumidores funcionariam como uma espécie de vírus do sistema, que, à semelhança de Neo, no filme Matrix, seriam produzidos para indicar as falhas e as possibilidades de correção do modelo. Ou seja: poderiam até causar mudanças no modelo, mas não alterariam as relações de força, comandadas, hoje, pelo mercado, e nem empreenderiam transformações sociais mais amplas.

Mas o movimento pelo consumo ético também inspira um outro tipo de interpretação que o coloca como novo ator social. Referindo-se ao livro “Sem Logo”, de Klein (2002), André Gorz argumenta que a autora retraça, ao mesmo tempo, o método e a extensão da “tomada dos espaços públicos e a resistência que ela encontra” (Gorz, 2005:51). Essa tomada se daria através da penetração cultural das grandes corporações e suas marcas publicitárias, gerando uma nova forma de conflito:

“uma luta de classes deslocada para um novo campo: o do controle da esfera pública, da cultura comum e dos bens coletivos. Os atores da resistência, organizada... em grande escala – ou melhor, auto-organizada localmente e internacionalmente graças à Internet -, são movimentos de estudantes secundaristas, de consumidores e de moradores decididos a reconquistar o domínio público, a novamente se apropriar do espaço urbano, a retornar o poder sobre seu meio, sua cultura comum e sua vida cotidiana.” (Gorz, 2005:51-52).

(...)“a política fracassou completamente no mundo inteiro e não é mais capaz de resolver nossos principais problemas – intolerância étnica e racial, desigualdades de renda, epidemias globais, a destruição do ambiente, o aquecimento global, ajudar o Terceiro Mundo e tantos outros. Onde a política falha, soluções mais perigosas e radicais tendem a aparecer...” (Ballard, 2005).

(...)Este ensaio teórico procurou compreender uma faceta do movimento de consumidores, denominada de “consumo ético”, visando entender até que ponto ele estaria forjando uma nova cultura de consumo, em oposição à cultura de consumo de massas. O levantamento bibliográfico realizado até o momento permite elucidar que, em conjunto com outros fatores - o esgotamento do mercado de consumo de massas e a demanda das empresas por novos nichos de consumidores; bem como, um problema real de sustentabilidade do planeta -, o movimento pelo consumo ético tem forçado a uma mudança de mentalidade e, portanto, à produção de uma nova cultura de consumo. Essa ainda emergente cultura de consumo pode ser localizada em movimentos pelo consumo verde, boicotes contra empresas que não são socialmente responsáveis ou, inversamente, através da compra positiva.(...)

://metamorficus.blogspot.com/2009/05/consumo-etico-e-acao-politica.html

Nenhum comentário: