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Nós somos velhos - há quem afirme que temos bilhões de anos em nossas células; no nosso paleoencéfalo conservamos a memória da humanidade.

 O Evangelho segundo Tomé lembra ao homem idoso que deve interrogar a criança; com efeito, o verdadeiro conhecimento não é acumulação de saberes, mas limpidez do olhar - inocência do coração.

A criança está mais próxima do Lugar da Vida, ainda não se encontra totalmente na dualidade, nem verdadeiramente separada da mãe e do mundo.

 Assim, pode ser interrogada sobre a origem - o começo.

O velho sabe que seu fim será como seu começo.

Qual era nosso rosto antes de nosso nascimento?

 Trata-se de uma questão semelhante a: "Qual será nosso rosto após nossa morte?"

A criança ainda conserva seu rosto de eternidade - de fonte tranquila - ainda não verdadeiramente sexuado, imagem do Andrógino primordial.

Seja qual for nossa idade - nossa velhice, o peso de nossas memórias - lembremo-nos dessa Criança que está em nós - a Criança Divina, o incondicionado: ela lançará sobre o mundo um olhar alegre e jovial da Fonte.

"Tornar-se o último."

 Lao-Tsé acoselha ao homem a arte de ser inútil - "sem uso " - , não pretender saber, observar simplesmente, ser a testemunha tranquila do que é.

A verdadeira gnose é uma grande desentulho: a pessoa descarrega palavras e conceitos inúteis a fim de que o espírito volte a se tornar puro espelho, olhar de criança: O lago esquecido no recôndito da floresta, no lugar onde ninguém se banha e que reflete, impecavelmente, a Lua - sem qualquer ruga.

"Desaprender. Descondicionar seu nascimento.

 Esquecer seu nome. Ficar nu.

 Despojar-se das roupas usadas. Despir sua memória.
Desmoldar suas máscaras. Rasgar seus deveres.

 Desfazer suas certezas. Desentulhar suas dúvidas.
 Desmantelar seu ser. Desbatizar sua fonte.

Desencaminhar seus caminhos. Desfolhar seus desejos.
 Desencarnar suas paixões. Dessacralizar os profetas.

Desmonetizar o futuro. Desconcertar o antanho.

 Desencorajar o Tempo. Frustrar a desrazão.

 Desflorar o delírio. Descaracterizar o sagrado.
 Desembriagar a vertigem. Desfigurar Narciso.

Soltar Galahad. Descoroar Moloch.
Destronar Leviatã. Desmistificar o sangue.

Descompor o chefe. Deserdar o antepassado.

Desentulhai vossa alma.

 Desfracassai vossos fracassos. Desencantai o desespero.

 Desencadeai a esperança. Soltai a loucura.

 Neutralizai vossos medos. Desamarrai vossos corações.

Desesperai a morte. Desnaturai o inato.

Desencrustai o adquirido. Desaprendei-vos.

............................................."FICAI NUS."

"Sura do Vazio" - Jacques Lacarrière

Fonte: "O Evangelho de Tomé", traduzido e comentado por Jean-Yves Leloup